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Siméia Teixeira; Jumara Azevedo



A HISTÓRIA LOCAL DE CAETITÉ ATRAVÉS DO CURANDEIRISMO
Siméia Teixeira Gomes de Souza Silva
UNEB
Prof. Mnt. Jumara Carla Azevedo Ramos Carvalho
UNIMONTES

O presente trabalho tem por objetivo relatar os resultados e pontos relevantes a respeito da aplicação de uma caixa temática sobre história local de Caetité, essa proposta foi pensada pela coordenação do PIBID de História e diante desse desafio surgiu a ideia de trabalhar com o curandeirismo, um fazer muito presente na sociedade caetiteense, mas que por uma série de fatores essa prática foi e é vista tanto no município quanto no Brasil de forma preconceituosa.
Para a realização das caixas temáticas, propomos um assunto pouco discutido nas escolas, mas que possui vasto campo de estudo, pois envolve as questões afro-brasileiras e também questões cotidianas de um povo e obviamente os diversos aspectos dessa sociedade no qual esses sujeitos viviam. A finalidade desse trabalho foi entender o contexto histórico pelo qual as práticas de cura foram negativadas e a partir daí estudar  e entender como que essa sociedade via os curandeiros bem como, os sujeitos que iam a procura destes e perceber as rupturas e permanências da mentalidade caetiteense em relação às curas populares. Objetivando difundir conhecimento da nossa cultura suprimindo preconceitos e estereótipos enraizados no conceito popular sobre o curandeirismo, a fim dos alunos conhecerem um pouco dessa história, que explica muito dos conceitos prévios que os mesmos tem sobre tal fazer.
O trabalho foi desenvolvido em duas aulas e por equipes para execução das quatro missões. Dentro de cada caixa possuía todas as instruções mais alguns envelopes de cores diferentes com as fontes necessárias para desempenhar a tarefa.
 Antes da divisão das equipes foi feito um breve histórico de como surgiu essas práticas de cura no Brasil e quais os fatores que levaram tal fazer, ser visto de forma negativa na sociedade brasileira e após essa explanação foi trazido essa problemática para a história local de Caetité, traçando um paralelo histórico da cidade que levou o município a negativar o curandeirismo.
A primeira missão possuía alguns trechos do Processo crime movido em 1967 contra o curandeiro Antônio Lessa, que residia em Tanquinho do Papagaio em Maniaçu (Caetité). E através desse processo os alunos responderam alguns questionários que os levavam a analisar como essas práticas eram vistas antes e hoje em Caetité, quais as rupturas e permanências, levando a refletirem sobre o conceito popular que as os mesmos tem sobre essa temática.
Na segunda missão foi apresentado aos alunos duas entrevistas, feita pela historiadora Adriana Sacramento, a uma benzedeira da região de Caetité conhecida como Dona Eliza, nesse relato oral essa senhora narra como ela produz seus remédios e como estes são preparados. E a partir da análise dessas entrevistas, foi pedido aos educandos para destacarem quais das ervas medicinais citadas eles conheciam, apresentando como que as mesmas são utilizadas de acordo seus conhecimentos, foi pedido também aos alunos que relatassem outras ervas medicinais utilizadas pela população caeteense, descrevendo-as e qual sua a sua finalidade. O objetivo com essa proposta foi fazer com que os discentes percebessem como que essas práticas de cura esta presente em nosso cotidiano e através disso conhecerem um pouco dessa tradição cultural, que nos é passado de geração em geração e que esta gravada nos seios das famílias caeteense, mas que ainda precisa ser reconhecida como algo cultural.
Na terceira missão foi apresentada aos alunos uma imagem veiculada no Jornal A Penna no ano de 1912, e para fundamentar a proposta debruçamos no trabalho de Adriana Sacramento, que utiliza a imagem como fonte de pesquisa. A imagem estudada é um anúncio de remédios para variados males corriqueiros na sociedade de Caetité naquele período, todavia o medicamento da propaganda, diferente das curas popular era um remédio farmacêutico comprovado pela ciência. Além dessa imagem na caixa também possui algumas ervas medicinais utilizadas por benzedeiras e que fazem bem para a saúde comprovado cientificamente. Nessa incumbência foi pedido aos educandos, que após essas leituras, pesquisasse sobre pessoas próximas de sua família ou comunidade que fazem essas práticas de benzer, cultivar e vender ervas, após isso estes deveriam fazer descrição desses sujeitos e qual e o lugar destes na sociedade e como essa mesma sociedade os vê hoje. Assim, a finalidade dessa missão foi fazer uma relação passada e presente do embate entre a medicina oficial e popular e como que isso reflete na nossa região hoje.
E por fim, na quarta missão foi trabalhado com outra imagem encontrada no Jornal A Penna e que também foi utilizada por Adriana Sacramento, essa imagem é muito interessante, pois ela é uma propaganda de um remédio para dor de cabeça. Todavia o titulo do anúncio é “Benzedura” o que leva o leitor em primeiro momento a acreditar que a propaganda é sobre esse fazer, mas na verdade é apenas uma crítica a cura popular, além disso, a figura apresentada é marcante, pois mostra uma senhora negra com um galho na mão, benzendo uma moça branca que esta deitada na cama fazendo alusão de dor na cabeça. Além dessa fonte na caixa, possuíam alguns textos explicando o que é religião, diversidade religiosa, intolerância e também alguns trechos da Constituição Federal evidenciando que é crime a intolerância religiosa e ainda alguns artigos do Código Penal de 1890, no qual as práticas de cura eram considerada crime.
Nessa última missão foi pedido para que a equipe criasse uma história fictícia que envolvesse a benzedeira da imagem, apontando a intolerância religiosa e a importância de respeitar a religião do outro, apontando algumas possíveis estratégias de combate à intolerância religiosa, no nosso município. O objetivo foi trabalhar a analogia do negro com as práticas, de cura e a relação desse preconceito associado com histórico brasileiro de inferiorização, da cultura africana embasadas em uma ideologia eurocêntrica.
O trabalho sobre história local através do curandeirismo deu muito certo, pois alcançamos o nosso objetivo que era desenvolver a consciência histórica nos alunos através de mecanismos que os facilitassem a compreender a sociedade relacionando o passado com o presente e possibilidades para o futuro. Os estudantes conhecerem um pouco da história local de Caetité, reformularam seus conceitos prévios sobre as práticas de cura popular, principalmente sobre a figura do curandeiro, até então visto pela maioria dos alunos como um ser diabólico e demoníaco que fazia mal para as pessoas.
A partir de determinadas colocações dos alunos e após algumas intervenções eles começaram enxergar uma tradição cultural nos fazeres desses sujeitos e perceberem que independente da religião o curandeirismo é uma prática que faz parte da nossa cidade e isso fica perceptível na fala de uma aluna: “Para usar as ervas medicinais não precisa procurar um curandeiro”. Partindo dessa colocação os estudantes começam a compreender que as famílias caetiteenses por si só já carregam uma herança cultural que é passada de geração em geração no qual é transmitidos saberes dessa cura intitulada como popular, onde as pessoas aprendem com pais e avós como curar determinados males com ervas e chás.
Diante dessa e de outras colocações percebemos o quanto a cultura de utilizar as receitas caseiras faz parte da nossa tradição, esses alunos apesar da pouca idade eles já carregam consigo essa tradição cultural e isso é muito significativo para formação da identidade desses enquanto sujeitos sociais. O que falta é o reconhecido do valor desses saberes tradicionais, falta há esses meninos e meninas reconhecerem sua história e assim se encontrar dentro do mundo e parar de valorizar o que é do outro para valorizarem a si mesmos e o primeiro passo é justamente esses aprender mais sobre si, sobre sua cultura, sobre sua história.

Referências:
OLIVEIRA, Ires Verena. O Feitiço da Cura: História do Povo de Santo, Feitiçaria e Curandeirismo na Bahia (1930-1960).Salvador. Tese de Doutorado em Estudos Étnicos e Africano/UFBA,2014.
OLIVEIRA, Rúbia Mária, TEIXEIRA, Sileje Santana. A Cura que se crê as práticas que se temem: Análise do processo Criminal de Antonio Lessa da Silva (Caetité-1967). UNEB. 2014.
SANTO, Edmar Ferreira. O Poder dos Candomblés: Perseguição e Resistência no Recôncavo da Bahia. Salvador. Edufba, 2009. 
SIMAN, Lana Mara de Castro. O papel dos mediadores culturais e da ação mediadora do professor no processo de construção do conhecimento histórico pelos alunos. In: ZARTH,Paulo e outros.(orgs) Ensino de História e Educação. Ijuí: Ed. Unijui, 2004. VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. São Paulo: Martins Fontes, 1988. (Coleção Psicologia e Pedagogia).
PRADO, Daniel Porciuncula, MARCEDO, Sabrina Meirelles. Reflexões a cerca do ensino de História: a História Local e a Consciência Histórica. Revista Latino-Americana de História. Vol. 2, nº. 6 – Agosto de 2013 – Edição Especial.


5 comentários:

  1. Boa tarde!!! Em seu trabalho sobre o tema com os alunos em algum momento você encontrou alguma resistência dos mesmos ou dos pais dos alunos??. Faço essa pergunta pois no local onde moro, Rio de Janeiro, muitas das vezes trabalhos como este encontram resistência dos alunos e em alguns casos até mesmo problemas com os pais em decorrência de preconceito e etc. Grato, Marlon Barcelos Ferreira

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  2. Sim, no primeiro momento alguns alunos se espantaram com a ideia de discutir as práticas de cura por considerarem tal fazer como algo demoníaco, mas no decorrer das discursões nos abordamos um pouco do contexto histórico que criou todo esse preconceito em torno do curandeirismo, e assim conseguimos trabalhar essa temática como algo cultural.

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  3. Boa noite.Quanto a professora regente,quando vc disse o tema a ser abordado ela aprovou logo de imediato?
    Eliana Pereira da Silva

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  4. Bom dia!Durante a elaboração desse trabalho, em se tratando desse assunto ainda se percebe muito preconceito por parte da população, ou já é mais flexível comentar esse assunto?
    Att, Maria Aparecida Pereira

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  5. Quais foram as dificuldades encontradas para elaboração das aulas e das missões?
    Att, Maria Aparecida Pereira

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