Páginas

Richard Batista

A IMPORTÂNCIA DO ENSINO DE HISTÓRIA LOCAL E REGIONAL NA CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE SOCIAL DE ALUNOS DO ENSINO FUNDAMENTAL
Richard Batista Silveira
História UESC

O atual modelo de ensino de história, em vigor desde a década de 1980 é ainda baseado na apropriação do conhecimento a partir da prática do acúmulo de informações, efetuado muitas vezes a partir da memorização mecânica e de conhecimentos superficiais (por vezes adquiridos tão somente nos livros didáticos). Esse modelo de ensino acaba por tornar a História uma disciplina personalista, que enaltece heróis e enfatiza acontecimentos isolados, o passado sendo uniformizado, excluindo a participação dos “dominados”, e a participação da comunidade nos “grandes acontecimentos Históricos”. Fonseca afirma que:
É interessante observar que há uma tentativa de legitimar pelo controle do ensino de História, a lógica política do Estado e da classe dominante, anulando a liberdade de formação e de pensamento da juventude, homogeneizando a imagem desses sujeitos sociais, em torno da imagem do homem que melhor serve aos interesses do Estado e da Nação (FONSECA, 1993: 61)
Podemos notar que existe a participação do Estado no processo de ensino da disciplina de História, o que gera uma certa exclusão do indivíduo, e por sua vez uma desconsideração do valor da coletividade, uma imposição de valores e memórias que faz do processo de aprendizagem da disciplina de História uma atividade enfadonha, sem sentido ou utilidade prática. Não se tem uma visão de ciência histórica ou mesmo uma visão crítica dos temas abordados, mas, sim, a História é vista como matéria decorativa, a qual precisamos somente recorrer ao livro para buscar nomes e datas ainda não decorados. Essa realidade não é de se estranhar, basta observarmos a distância existente entre a realidade vivenciada pelo indivíduo em sua comunidade e o tratamento dado ao ensino de História, fazendo do aluno não mais que um mero espectador dos fatos já “prontos”, e não um agente transformador da História e da sociedade, não necessitando esforços no sentido de qualquer reflexão ou elaboração sobre o passado.
Ainda é predominante no Brasil o modelo de ensino de História com uma vertente bastante eurocêntrica. Modelo que emite a ideia de que a Europa e seus elementos culturais caracterizam referências para a composição de toda a sociedade moderna, fato que pode ser comprovado através da análise dos livros didáticos aprovados para utilização no ensino fundamental, são temas que abordam em sua maioria o processo civilizador Europeu gerando uma imagem de indolência dos “povos” do novo mundo – o conceito de civilização passa a ser utilizado por volta do século XIX sendo usado frequentemente para legitimar o poderio da sociedade Europeia baseando-se na comparação e no preconceito entre as diferentes sociedades, não fazendo a mínima alusão ao dia-a-dia dos alunos.
No Brasil temos como referencial para o ensino de História os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), que tem como pressuposto a condução do professor em seu processo de ensino, não de forma homogênea ou impositiva. Não existe a pretensão de sobrepor as competências que são confiadas aos Estados, Municípios, Professores e Agentes escolares de forma que os PCNs preceituam que o ensino de História local deve ser uma referência no ensino de História. A questão da construção de uma identidade social também é uma das referências proposta pelo PCN de História para o ensino fundamental, quando afirma que um dos objetivos da disciplina de História no nesse nível é proporcionar métodos que levem os alunos a capacidade de:
Conhecer características fundamentais do Brasil nas dimensões sociais, materiais e culturais como meio, para construir progressivamente a noção de identidade nacional e pessoal e o sentimento de pertença ao país. (BRASIL, MEC: 1998)
Fica claro a necessidade da análise do local para capacitar o aluno na construção de uma identidade social, entretanto, o processo de ensino-aprendizado da disciplina de História tornou-se meramente livresca, ao passo que são aplicados os conteúdos tratados como universais, já conhecidos e decodificados nos livros didáticos, abandonando-se a história local e por sua vez a possibilidade da construção de uma identidade social de determinadas comunidades. É inaceitável conceber o fato de que os estudantes de ensino fundamental conheçam toda a História Geral, e em contrapartida desconheça sua própria História, a História de sua comunidade, quem somos? De onde viemos? Vasconcelos afirma que:
A História, como uma área de conhecimento, sempre existiu. Por isso, existe uma busca incessante sobre o passado dos povos os quais descobrem que, da mesma forma que o passado de uma pessoa é importante para que ela conheça sua própria identidade, também os vários povos da Terra buscam narrativas acerca do seu passado, já que as comunidades humanas também possuem identidade, uma pessoa se reconhece como brasileira, por exemplo, porque o Brasil tem um passado que a ajuda a compreender nossa identidade coletiva. (VASCONCELOS, 2007)
Para entendermos essa identidade é preciso olharmos atentamente para aos vários momentos em que a coletividade se faz presente nos movimentos de alteração (ou manutenção) da dinâmica social e histórica. Levando em consideração a mistura de culturas que compõe o povo Brasileiro, cuja construção ideológica e conceitos ainda são baseadas essencialmente na cultura europeia, percebe-se que o uso do livro didático, em sua maioria eurocêntricos, acaba sendo o único recurso que professores e alunos possuem para instrumentalizar sua prática escolar, reproduzindo as verdades históricas, sem ampliar o leque de discussão para a História local. Contudo, a importância do livro didático vai além do conteúdo que traz em seu interior:
(...) é preciso reconhecer, diante da realidade brasileira que, muitas vezes, os livros ou manuais didáticos são os únicos materiais de leitura e de acesso de grande parte da população às informações históricas. Cumprem uma função social importante na difusão do saber letrado, da cultura e da História do Brasil e dos povos. Simbolicamente, os livros distinguem nas ruas das cidades e nas estradas aqueles que são estudantes. Nos deslocamentos da casa para a escola ou da escola para o trabalho garantem, assim, a segurança de crianças, jovens e adultos, por portarem um símbolo de comportamento valorizado socialmente. Indicam aqueles que frequentam a escola e assumem uma responsabilidade comprometida com o presente e o futuro. (BRASIL, MEC: 1998)
Sendo o livro didático muitas vezes o único recurso de consulta, essa exclusividade não faz com que seus conteúdos sejam efetivamente aproveitados na questão da formação de uma identidade, pois, os temas apresentam uma visão histórica que tende a afastar o aluno de uma possível compreensão dos fatos. A História apresentada pelos livros didáticos são vistas como incontestáveis, uma história “já pronta”, feita pelos que dominam, negando a participação de pessoas comuns na história, oferecendo um grande silêncio historiográfico sobre a história dos denominados como vencidos. Segundo a Professora Idelsuite Lima:
Ao negarem a participação das pessoas comuns na história, os livros didáticos reforçam a ideia de que a história é feita pelos grandes, pelos dominantes, pelos que estão no poder e descartam qualquer perspectiva de possibilitar ao aluno a sua participação na construção da história. (Lima 2000, 01-117)
Pelo exposto podemos notar que a é História ensinada nos moldes eurocêntrico porque há uma valorização dos fatos e dos nomes históricos vindo da Europa, como a divisão política e temporal da História, transmitindo uma ideia de que as grandes transformações Históricas ocorreram graças a personalidades isoladas e da mesma intensidade enaltecendo “vultos históricos”, pouco (ou nada) contribui para a formação de uma identidade nacional. Como exemplo nós temos o fato de que praticamente todos os estudantes elencam a inconfidência mineira como o principal (talvez o único) acontecimento que culminaria na independência do Brasil de Portugal, porém, esquecendo-se daslutas populares ocorridas na Bahia, como por exemplo a Sabinada, onde houve a participação de pessoas de todas as classes e não só a elite econômica. Essas revoltas não são tão difundidas e muito menos os nomes de seus envolvidos permeia os imaginários dos alunos, sequer dos alunos de escolas baianas.
É a partir do local que o indivíduo passa a perceber o mundo, pois o primeiro contato de sociedade que temos é a comunidade local, é a partir do conhecimento dos indivíduos ao nosso redor que conseguimos adquirir um autoconhecimento que serve para a criação de um sentimento de pertença a esse grupo ou diversos outros grupos: “sou Soteropolitano”, “sou Baiano”, esse sentimento de pertença altera a dinâmica social, cultural e política de uma determinada região.
A necessidade de participação é evidente em indivíduos que se identificam com a dinâmica de sua comunidade. O conhecimento de sua História leva a uma valorização de sua localidade e gera além do sentimento de pertença a esse local, um despertar da noção de cidadania que por sua vez contribui para a construção de uma identidade social. Sentimos a necessidade de ser reconhecido como pertencente a uma determinada região, entretanto primeiramente é preciso reconhecer-nos integrantes de determinada dinâmica social, objeto esse que poderia ser fruto de debates em sala de aula no ensino fundamental, para a construção de uma educação mais inclusiva e libertadora.

Referências bibliográficas
BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). Introdução. Ensino Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998.
FONSECA, Selva Guimarães, Caminhos da história ensinada. Campinas, Papirus, 1993.
LIMA, Idelsuite de Sousa. Ensino de História Local e Currículo: idéias, dizeres e práticas no fazer educativo escolar. João Pessoa, 2000. (Dissertação de mestrado). Universidade Federal da Paraíba.
LIMA, Idelsuite de Sousa. Ensino de História Local e currículo: primeiras reflexões. Caderno de Educação Popular. João Pessoa: UFPB/PPGE, 2000.

VASCONCELOS, José Antonio. Metodologia do ensino de história. Curitiba: IBPEX, 2007.

2 comentários:

  1. É muito importante para qualquer individuo conhecer a sua própria história e a de sua comunidade; com isso terá uma melhor compreensão do espaço que está inserido. Porém, o que constatamos nos livros didáticos é uma história mais ligado ao eurocentrismo e menos ao regionalismo que serve para atender uma demanda dos vestibulares e outras avaliações de caráter nacional.
    Como devemos fazer para uma melhor conscientização da importância do estudo da história local e regional?

    ResponderExcluir
  2. Todos nós sabemos como é importante situamos o espaço que vivemos, conhecendo a sua história como foi desenvolvido as práticas culturais e outras manifestações culturais, porem essas história muitas vezes são apenas oralidade e não exite no ensino formal.

    Com isso, quais as atitudes que devem ser tomadas para a introdução do ensino da história local ser parte do livro didático?

    ANTONIO FRANCISCO DE SOUZA

    ResponderExcluir

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.