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Márcio Vitor Santos

IMAGEM E ENSINO DE HISTÓRIA ANTIGA: UMA INTRODUÇÃO
Márcio Vitor Santos
UPE – Campus Mata Norte

Sobre a problematização que envolve o ensino de História, vários pontos devem ser levados em consideração, visto que uma determinada questão ou problema é construído a partir de diversos fatores. Talvez um que mereça destaque é a “história decorada pelo aluno”. Circe Bittencourt (2011, p. 68-69) nos fala que a metodologia utiliza nos livros escolares do século XIX apelava mais para a memorização das datas e dos grandes nomes da História. A História, portanto, passa a ser um amontoado de informações que simplesmente devem ser memorizadas pelos alunos, que muitas vezes não conseguem entender o assunto abordado ou até mesmo não fazem reflexões sobre o acontecido ou sobre sua vida pessoal. Em suma, é enfatizado que
“(...) parece ter prevalecido não exatamente a preocupação com uma memorização ativa, mas simplesmente com a decoração de nomes e datas dos grandes heróis e dos principais acontecimentos (...). Os métodos de ensino baseados na memorização correspondiam a um entendimento de que ‘saber história’ era dominar muitas informações, o que, na prática, significava saber de cor a maior quantidade possível de acontecimentos de uma história nacional. (BITTENCOURT, 2011, p. 69)”
Um dos principais propósitos de se estudar História é promover a formação individual, além da tomada de consciência do indivíduo como sujeito do processo histórico. Indagar-se sobre qual o lugar do indivíduo na trama da História é refletir sobre as complexas relações sociais e cotidianas (BEZERRA, 2005, p. 45). Portanto, a História se torna fundamental para a vida do educando. Em outras palavras, “essa área do conhecimento tem muito a contribuir para a formação dos indivíduos, pois ela nos permite compreender as transformações socioeconômicas, políticas e culturais que estamos vivenciando, desenvolver valores e construir identidades. (SERRAZES, 2014, p.1)”
Outro ponto deve ser destacado: a precariedade de novos métodos de ensino. Segundo Boris Kossoy (2001, p. 30), a tradição escrita tornou-se o método mais tradicional para a transmissão do saber. Entretanto, há um aprisionamento multissecular a essa tradição, impossibilitando assim o uso de novos métodos para ensinar História.
Esse aprisionamento atinge principalmente os professores de História Antiga. No mundo contemporâneo, a Antiguidade torna-se cada vez mais distanciada, principalmente no ponto de vista do educando, que vê a História como algo a ser decorado e que não terá influência significativa em sua concepção de mundo, uma vez que o mundo antigo situa-se em um período remoto. Nesse contexto, há uma necessidade de aproximação entre os mundos.
Antiguidade nos deixou um vasto legado cultural, através de suas artes e construções, como os vasos gregos, as pirâmides egípcias e as estátuas romanas, que são exemplos da ampla cultura material produzida nos tempos antigos. Percebe-se, então, que o profissional de História Antiga dispõe de elementos que podem ser úteis para a produção do conhecimento histórico. Contudo,
“(...) a construção do conhecimento histórico, bem o sabemos, requer contextualização, e ao professor de História Antiga tal necessidade é, talvez, ainda mais premente, dadas as distâncias espaço temporais que separam seus educandos dos temas abordados. (NETO, 2014, p. 5)”
Nessa abordagem, aquilo que Pedro Paulo Funari (2005) chamou de “renovação do ensino da História Antiga” pode ser bem discutido: novas estratégias de ensino, incentivando o aspecto lúdico do aprendizado e da pesquisa, a produção de conhecimento histórico sob a capa da espontaneidade, da brincadeira. Segundo o próprio, “a História, em especial a Antiga, não se faz apenas com documentos escritos, mas também com a cultura material” (FUNARI, 2005, p. 96). Essa cultura material – reproduzida nos vasos gregos, nos grandes monumentos, nas construções das cidades antigas – pode ser apresentada aos professores como novas ferramentas pedagógicas de ensino e, doravante, levando à formulação de novas estratégias para se ensinar História. Dessa maneira, o diálogo entre a Antiguidade e o mundo dos educandos torna-se mais interessante, levando o indivíduo a aguçar sua curiosidade intelectual e, assim, exercitando sua capacidade analítica.
Na atualidade, devido aos avanços científicos e tecnológicos, uma gama de conhecimentos e possibilidades de compreensão surge. “As mudanças culturais provocadas pelos meios audiovisuais e pelos computadores são inevitáveis, pois geram sujeitos com novas habilidades e diferentes capacidades de entender o mundo (BITTENCOURT, 2011, p. 108)”.
Nessa perspectiva, o profissional de História – que também está inserido nesse contexto de mudanças culturais e avalanches de informações – deve apropriar-se desses meios como ferramenta pedagógica. Um dos meios que mais podem ser proveitosos para o ensino de História são as imagens e fotografias, pois
“vivemos em uma sociedade visual com intensas transformações tecnológicas onde uma avalanche de imagens tem atravessado o espaço social e o mundo do espetáculo exerce uma influência considerável nas relações sociais. Por todos os lugares em que andamos, encontramos imagens que formam sentidos e criam significados. Tal situação pode interferir na naturalização das imagens por parte de professores e alunos. Mas o trabalho com imagens em sala de aula pode ainda se constituir em uma experiência riquíssima de aprendizado, servindo para o questionamento das verdades imagéticas e, portanto, para a sua desnaturalização. (SILVA, 2010, p. 177)”
A fotografia, por exemplo, “teria papel fundamental enquanto possibilidade inovadora de informação e conhecimento, instrumento de apoio à pesquisa nos diferentes campos da ciência e também como forma de expressão artística” (KOSSOY, 2001, p. 25). Surgida após a Revolução Industrial, essa nova ferramenta emerge como uma nova forma de compreensão do mundo. As imagens registradas pelos aparelhos fotográficos possibilitaram ao indivíduo conhecer novos lugares, sem precisar viajar ou locomover-se por grandes distâncias. Além disso, possibilitou também o conhecimento de micro aspectos até então desconhecidos.
A fotografia também pode ser considerada, nas mãos do historiador, como fonte. Diferente do Positivismo, que dava apenas credibilidade aos documentos e registros oficiais, a Escola dos Annales abriu um leque de novos objetos que podem ser considerados como fontes e “foi fundamental para esse novo estatuto das imagens e outros documentos, o que ampliou os objetos de estudo da história” (SILVA, 2010, p. 174).
Na sociedade contemporânea, as imagens podem ser interpretadas de diferentes maneiras pelos indivíduos que compõem essa sociedade, ou seja, o olhar do observador modifica o objeto. É o que Kossoy também alerta sobre a “leitura” das imagens:
“No esforço de interpretação das imagens fixas, acompanhadas ou não de textos, a leitura das mesmas se abre em leque para diferentes interpretações a partir daquilo que o receptor projeta de si, em função do seu repertório cultural, de sua situação socioeconômica, de seus preconceitos, de sua ideologia, razão por que as imagens sempre permitirão uma leitura plural.” (KOSSOY, 2001, p. 115)
Diante disso, as informações textuais são imprescindíveis para o melhor entendimento do que a imagem quer mostrar e quais informações ela pode oferecer. “A transposição em linguagem textual auxilia a decifração visual, intercalando as linguagens visual e verbal, pois a descrição não deixa de ser a mediadora da explicação” (MOLINA, 2008, p. 123).
A partir do momento em que o profissional de História apodera-se dos novos métodos de ensino de História, sua prática docente atinge melhores desempenhos e novas perspectivas, levando sempre a repensar sua própria prática. As imagens como ferramenta pedagógica no ensino de História Antiga podem atuar como mediadoras culturais, levando os alunos a construírem suas visões da História Antiga a partir desse contato.

Referências
BEZERRA, Holien Gonçalves. Ensino de História: conteúdos e conceitos básicos. In: KARNAL, Leandro (Org.). História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas. São Paulo: Contexto, 2005.
BITTENCOURT, Circe Maria F. Ensino de História: fundamentos e métodos. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2011.
FUNARI, Pedro Paulo. A renovação da História Antiga. In: KARNAL, Leandro (Org.). História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas. São Paulo: Contexto, 2005.
KOSSOY, Boris. Fotografia e história. 2. ed. rev. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001.
MOLINA, Ana Heloisa. Imagens como documentos – Professores, alunos e o ensino e aprendizagem de História: uma relação complexa. Textura, Canoas, n. 17, p. 121-134, jan./jun. 2008.
NETO, José Maria Gomes de S. O teatro ateniense na formação do historiador. Boletim Historiar, Santa Catarina, n. 4, p. 3-19, jul./ago. 2014.
SERRAZES, Karina Elizabeth. Fundamentos e métodos do ensino de História: algumas reflexões sobre a prática. In: XXII ENCONTRO ESTADUAL DE HISTÓRIA, 1., 2014, São Paulo. Anais do XXII Encontro Estadual de História da ANPUH-SP. São Paulo: ANPUH, 2014.

SILVA, Edlene Oliveira. Relações entre imagens e textos no ensino de história. Sæculum – Revista de História, João Pessoa, n. 22, p. 173-188, jan./jun. 2010.

7 comentários:

  1. Olá, Márcio. É bem interessante a inserção de novos métodos para o ensino da História, nessa perspectiva, gostaria de saber como você lida com a utilização de imagens em sala de aula, quais cuidados são tomados e que tipo de resultado gera.

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    1. Olá, Geanne.
      Ao trabalhar as imagens em sala de aula, alguns pontos devem ser levados em consideração.
      O primeiro deles é que uma determinada imagem, por si só, não "dirá" nada à primeira vista. Sendo assim, cabe ao professor fazer a ponte entre imagem e aluno, trazendo informações e trabalhando-as.
      O segundo é que cada aluno terá sua própria interpretação, a partir de sua vivência e do seu repertório cultural e intelectual. Ou seja, as imagens são passíveis de qualquer análise e interpretação. O professor deve ter isso em mente e direcionar - através das discussões e métodos - os alunos ao longo das aulas.
      A partir da utilização das imagens como ferramenta pedagógica, espera-se que os alunos possam entender de forma mais prazerosa e lúdica o mundo onde eles vivem.

      Forte abraço.

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  2. Gostei muito do seu trabalho e tenho interesse em pesquisar mais sobre o tema.
    Teria algum livro para indicar sobre a temática ?

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    1. Olá, Lisley.
      Desde já, agradeço sua consideração.
      Fico feliz que tenha despertado interesse nessa área.
      De início, posso indicar-lhe a bibliografia utilizada neste trabalho.
      Um livro bem interessante para dar início aos estudos relacionados a História e Imagem é o clássico do Peter Burke, intitulado "Testemunha ocular: história e imagem".

      Abraços.

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  3. Olá Márcio.
    É um texto bem interessante, que expõe uma das formas mais práticas e atrativas de trabalho em sala de aula. Gostaria de perguntar como você atrelaria o uso de imagens e a literatura antiga de forma em que a literatura sejam igualmente atrativas para o aluno.

    Ass: Danrley Messias Rodrigues dos Santos

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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