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Laerte Pedroso

GRÉCIA EM CENA: O APRENDER BRINCANDO
Laerte Pedroso
Prof. Esp. História UNINTER

A história como ciência precisa estar em constante movimento e adaptação, de acordo com as necessidades da sociedade contemporânea. O mesmo acontece com o ensino de História. Ainda hoje o modelo de ensino predominante nas escolas de Pelotas/RS é o Tradicional, no qual o professor é detentor do conhecimento, acumulado ao longo do tempo, e os educandos são Alunus (sem luz) que necessitam acumular conhecimentos para serem bem sucedidos.  Nosso educando está cada vez mais conectado, bombardeado diariamente com inúmeras informações de seu interesse, deixando a escola, por conseguinte, cada vez mais desinteressante. Assim nos propusemos a estudar de uma forma diferenciada conceitos sobre a Grécia Antiga através de uma metodologia lúdica, usando o teatro como ferramenta agregadora do processo de ensino-aprendizagem.
O teatro é uma invenção grega do século VI, surgiu em festas conhecidas como dionisíacas, em homenagem ao deus do vinho. Por isso consideramos que ao utilizarmos o teatro como ferramenta pedagógica para ensinar Grécia Antiga tenha um valor simbólico muito forte. A arte dramática é apresentada na forma de jogos teatrais em que o educando se sente transportado ao passado para interagir com o Antigo, como se fosse Novo.
O grande objetivo foi transformar o ensino de História Antiga em algo novo, palpável, que o educando se sentisse parte daquele processo, vivenciando o Mundo Antigo.

Revitalizando a prática pedagógica
A escola tem papel fundamental na vida todos nós, mas preciso resaltar que a minha escola, La Salle – Pelotas, possui um papel ainda mais importante, pois embora seja uma escola particular tem como público alvo crianças à beira da miserabilidade social que estão inseridas em bairros pobres da nossa cidade: Bairro Navegantes, Bairro Fátima e Bairro Cruzeiro.
Nossa escola trabalha com o norte da transformação social de uma comunidade muito carente, que necessita de todo tipo de amparo presente e opção de futuro e, para tanto, busca unir as forças entre professores, pais, alunos para alcançar esses objetivos.
Como educador acredito na transformação da sociedade através da educação, e o nosso papel é mediar o conhecimento para que os educandos alcancem o maior sucesso possível em suas vidas. Assim, minha prática pedagógica deve estar sempre em transformação, acompanhando as novas tecnologias e metodologias de ensino-aprendizagem, fornecendo inúmeras formas de colaboração.

Cena 1: Proposta e metodologia
Educar é uma tarefa complexa que exige muito estudo, qualificação e dedicação, segundo Freire (1997, p. 25 – 26).
Quem forma se forma e re-forma ao formar e quem é formado forma-se e forma ao ser formado. É neste sentido que ensinar não é transferir conhecimentos, conteúdos, nem formar é ação pela qual um sujeito criador dá forma, estilo ou alma a um corpo indeciso e acomodado. ( … ) Quando vivemos a autenticidade exigida pela prática de ensinar-aprender participamos de uma experiência total, diretiva, política, ideológica, gnosiológica, pedagógica, estética e ética, em que a boniteza deve achar-se de mãos dadas com a decência e com a seriedade
Avaliando essa perspectiva todo início de ano letivo explico ao educando o que será estudado durante o ano. Apresento o livro, os autores e o tipo de metodologia que costumo utilizar em sala de aula, a partir daí formatamos o contrato didático que segundo Brousseau (1996, p. 50).
O conjunto de relações estabelecidas explicitamente e/ou implicitamente entre um aluno ou grupo de alunos, um certo milieu (...) e um sistema educativo (o professor) para que esses alunos adquiram um saber constituído ou em vias de constituição.
Partindo dessa investigação solicitei aos alunos que me indicassem a forma como gostariam de aprender os conteúdos do 6º ano. Grande parte indicou que gostariam de aprender brincando, que usasse recursos tecnológicos e práticos. Surgiu então a ideia do teatro para o terceiro trimestre, pois aprenderam que na Grécia essa arte havia surgido e, portanto seria legal conhecê-la por meio dessa prática. Possuo experiência em teatro como autor, ator e diretor, assim, considerei a ideia como sendo muito válida.
Elaborei uma proposta de ação pedagógica que foi prontamente aceita pela minha coordenação e direção da Escola La Salle – Pelotas, que me apoiaram na ideia e propiciaram os recursos necessários para a realização da mesma, mostrando que o papel da escola está justamente fundamentado na mediação do conhecimento.
No dia 14 de Setembro de 2015 teve início o terceiro trimestre na escola e apresentei aos educandos a proposta de teatro. Toda a nota trimestral seria fornecida por esse trabalho que, para tanto, seria avaliado em diversas etapas:
1.       Aula expositiva e dialogada sobre Grécia Antiga. (oito aulas de 50 minutos cada).
2.       Pesquisa sobre o cotidiano da Grécia Antiga (Família, relação com os deuses, casamento, educação, arte, filosofia, música, etc.). (três aulas de 50 minutos cada).
3.       Escolha do tema (uma aula de 50 minutos).
4.       Elaboração do roteiro teatral. (quatro aulas de 50 minutos cada).
5.       Produção e confecção de figurinos, adereços e cenários. (duas aulas de 50 minutos cada).
6.       Criação de uma paródia musical sobre o tema. (uma aula de 50 minutos).
7.       Ensaios. (três aulas de 50 minutos cada).
8.       Apresentação para a comunidade escolar. (Uma aula).

Produção do roteiro teatral
Essa foi uma etapa recheada de desafios. Ao passo que iam escrevendo eu ia acompanhando, fazendo correções históricas, dando dicas cênicas para o melhor aproveitamento das cenas. Aos poucos, os grupos foram definindo que tipos personagens seriam e que histórias contariam. Todos os grupos fizeram seus roteiros em sala de aula, uma exigência minha, para que todo o trabalho fosse desenvolvido em sala de aula, para minha mediação se fazer presente em todas as etapas da produção intelectual e para que eles não se sentissem desamparados ou buscassem algo pronto na internet.
Concluída essa etapa, os grupos passaram para a próxima: confecção de figurinos e adereços.

Os ensaios
Provavelmente um dos momentos mais esperados. Inicialmente os grupos organizados como tais fizeram leituras de texto, privilegiado as entonações que deveriam dar em cena, formatando a personagem de acordo com aquilo que eles consideravam ser o ideal.
Foi um momento de grande reflexão, já que os ensaios eram abertos ao público da turma. Tomei essa atitude para evitar a “surpresa” e com ela a vergonha de se apresentar perante a turma. Assim toda turma acompanhou o processo de todos, deixando-os mais à vontade.
Os ensaios serviram, também, como um momento de descoberta. Muitas ações que haviam pensado aplicar durante as leituras, não ficaram tão bons e precisaram ser alterados.
Um grupo teve a ideia de construir uma paródia sobre os espartanos, uma feliz ideia que foi contagiando diversos outros grupos a também criarem as suas, deixando o trabalho mais atrativo para quem assistisse. Isso fez com que voltassem à pesquisa teórica para que a produção musical tivesse de acordo com aquilo que buscavam apresentar.

Grécia em Cena
A sala de multiuso da escola foi utilizado como palco para as apresentações, contando com a presença do nosso diretor, nossa coordenadora pedagógica e nossa orientadora pedagógica.
As temáticas foram as mais variadas, porém algumas merecem destaque. Um grupo de meninas elaborou uma peça teatral sobre o machismo na Grécia Antiga. Elas seriam deusas que estariam reunião para discutir o machismo e como evitá-lo em Atenas. A temática mais utilizada foi o modo de vida dos espartanos. Ao final de cada apresentação os convidados faziam suas colocações, elogiando ou dando contribuições para melhorias nos trabalhos.

Considerações finais
Não há ensino sem o educando, assim cabe ao professor e equipe de colaboradores, fazer o possível para deixá-los cada vez mais motivado para realizar as tarefas de aula.
Percebemos que essa atividade envolvendo teatro e história na verdade extrapolou o campo dos dois componentes, pois os educandos perceberam a importância da língua portuguesa para produzirem seus roteiros, a importância da geometria e geografia para fazerem seus figurinos e adereços. O trabalho deixou de ser apenas um teatro sobre história para se transformar num teatro multidisciplinar.
Portanto, percebemos a importância do uso da arte como uma pedagogia diferenciada. Nela encontramos o aporte do lúdico para produzir um bom resultado na aprendizagem. Ao longo da jornada de professor sempre devemos nos revisitar, buscar novas ferramentas para aperfeiçoarmos nossa prática. O teatro se mostrou muito uma ferramenta eficaz, pois os alunos se sentiram agentes produtores de conhecimento e não meros reprodutores.
O educando ativo se mostra mais motivado a produzir, a engajar-se num contexto diferenciado. Assim, podemos deixar a escola mais interessante e toda a comunidade escolar mais feliz e realizada.

Referências Bibliográficas
BROUSSEAU, Guy. A Teoria das Situações Didáticas e a Formação do Professor. Palestra. São Paulo: PUC, 2006.
________________. Fundamentos e Métodos da Didáctica da Matemática. In: BRUN, J. Didática das Matemáticas. Tradução de: Maria José Figueiredo. Lisboa: Instituto Piaget, 1996a. Cap. 1. p. 35-113.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 12ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.
TEIXEIRA, Anísio. Educação e o mundo moderno. São Paulo: Ed. Nacional, 1977.

6 comentários:

  1. Gostaria de parabenizar o professor pela ideia de levar o teatro para a sala de aula, pois acredito que um aprendizado pode se tornar mais significativo quando os alunos são envolvidos com outras atividades, e dessa forma saem daquela rotina mecânica de escrever e copiar. Gostaria de saber no que o professor se baseou para ajudar os alunos a escreverem o roteiro. Também queria saber se o professor recomendaria que eu como professora levasse as histórias mitológicas para sala de aula como forma de os alunos criarem peças teatrais em cima delas. E no caso qual a melhor turma para se trabalhar com o teatro 6 ou 1 ano do ensino Médio?
    Morgana Lourenço

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    1. Olá Morgana, obrigado pelas questões levantadas. Eu trabalho com teatro a 20 anos, então sempre busquei aliar o teatro e o ensino de história. Antes dos alunos elaborarem os roteiros eu ministrei aulas teóricas sobre Grécia e apresentei os filmes: Tróia (editado), aquela série "As grandes Civilizações: Grécia Antiga" e o Pato Donald No Mundo da Matemática. Depois fizemos algumas discussões sobre os filmes e deixei as criações livre. Para evitar o copia/cola que a senhora mencionou adotei o critério de elaboração 100% em sala de aula, assim consegui evitar 90% dos problemas de plágio (embora aparecessem dois plágios que desclassifiquei e fiz prova tradicional). Creio que tanto com os 6º ou 1º anos seja positivo, porém a criançada curte mais e se envolve com mais responsabilidade, possuem menos medos de se exporem. Grande abraço.

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  2. Joséti Viana Alves5 de abril de 2017 às 07:28

    Olá, parabéns pelo trabalho e gostaria de saber o que os alunos acharam após a apresentação? Eles ficaram mais interessados nas aulas?

    Joséti Viana Alves

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    1. Olá Joséti, obrigado pela pergunta. Sim os alunos ficaram bem mais interessados nas aulas, aí ficamos com o compromisso de cada vez mais fazermos algo diferente para motivá-los.

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  3. Excelente trabalho!É muito difícil prender a atenção dos alunos e principalmente promover a aprendizagem, mas esse método utilizado parece ter siso muito eficaz, nada convencional, quebrando as barreiras do ensino tradicional e é disso que todos precisam, novas formas de promover a aprendizagem despertando o interesse e a participação dos alunos resultando na aquisição de conhecimento. Parabéns.
    Esse trabalho teve continuidade ou foi realizado somente com essa turma?

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    1. Olá Thaysa, obrigado pela pergunta. O trabalho foi realizado com minhas três turmas de 6º ano da escola La salle Pelotas. Agora sou servidor público do IFAM e tive que sair dessa escola, então nao pude dar continuidade.

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