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Darlã de Alves; Daniel Gevehr

EDUCAÇÃO ÉTNICO-RACIAL E SUA PROPOSTA INTERDISCIPLINAR
Prof. Mt. Darlã de Alves
Prof. Dr. Daniel Luciano Gevehr
FACCAT

Um assunto que vem promovendo inúmeros debates e reflexões é o que se refere à educação étnico-racial. Inserida no currículo escolar por meio da lei 10639/2003, traz a perspectiva de uma educação para equidade racial, através da obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileira e africana na educação básica. A aprovação desta normativa tem provocado uma reflexão sobre o currículo instituído em nossas escolas, que, historicamente, tem negado as diferenças culturais e valores civilizatórios africanos e afrodescendentes em nossa sociedade Moreira e Santana (2013).
Trazendo ao ensino da diversidade diversas experiências culturais e conhecimentos às ancestralidades antes não contempladas. Exigindo do professor preparo para a mediação deste conteúdo. Buscou-se responder, com este estudo, a seguinte questão problema: O ensino de história e cultura afro-brasileira e africana nas escolas está sendo realizado de forma interdisciplinar? Ou apenas abordado pelas disciplinas de história e ou literatura?
Pode-se perceber que o tema pode ser abordado de forma interdisciplinar, também em práticas pedagógicas específicas de cada disciplina. Traz-se um exemplo de um projeto pedagógico realizado em uma escola da rede municipal da cidade de Campo Bom/RS. Também apoiando-se em publicações produzidas no Brasil nos 12 primeiros anos em que a Lei 10639/2003 se encontrou em vigor.
A justificativa para esta pesquisa é de que a alteração da LDB feita pela lei 10639/2003 dá início a uma nova abordagem de diversidade cultural no ambiente escolar.  Anteriormente a esta determinação, o currículo de história abordava a cultura afro-brasileira e africana na figura do negro escravo submisso ao senhor de engenho. O que hoje ainda é facilmente identificado em diversos currículos escolares e materiais didáticos.
A história do negro no Brasil não se detém a escravidão. Este sim foi um grande episódio. Porém, limitar a identidade do negro afro-brasileiro e africano apenas a este acontecimento é ignorar toda sua matriz cultural que contribuiu para a formação da cultura do nosso país e do ser brasileiro.  Acredita-se na educação étnico-racial, como forma de conhecimento e valorização da cultura de todos brasileiros, buscando a equidade racial e eliminação do preconceito. 
A escola escolhida para a prática contempla alunos de 9 bairros da cidade. Possuindo alunos de todas as esferas sociais, seja de vulnerabilidade social à média alta. Consequentemente, este público de alunos se destaca em diversidade étnica cultural. 
Quanto aos procedimentos metodológicos, esta pesquisa pode ser classificada como um estudo de caso. Para selecionar os artigos científicos utilizados nesta pesquisa fez-se uso das palavras-chave “Educação étnico-racial. Ensino. Cultura afro-brasileira. Cultura africana.” entre o período de 2003 a 2015. Entre os 37 selecionados apenas 19 artigos abordavam alguma ferramenta de ensino, e a partir desses artigos desenvolveu-se um estudo detalhado. Os artigos que compõem este estudo foram selecionados na base de dados Scielo e Capes.
A escola onde foi realizada a prática está situada no município de Campo Bom/RS. É pertencente à rede municipal de ensino e possui turmas apenas dos anos iniciais do ensino fundamental do 1º ao 5º anos. É importante ressaltar que a escola é um ambien­te privilegiado para a promoção de relações étnico-raciais positivas em virtude da marcante diversidade em seu interior.   Porém, não é a única instituição respon­sável pela educação das relações étnico-raciais, uma vez que o processo de se educar ocorre também na família, nos grupos culturais, nas comunidades, no convívio social proporcionado pelos meios de comunicação, entre outros (VERRANGIA E SILVA, 2010).
Fernandes (2005) ressalta a importância da abordagem em caráter interdisciplinar, onde o tema perpasse as disciplinas de forma a interligar os conhecimentos gerados através de suas práticas pedagógicas. Um trabalho árduo quando nos deparamos com currículos tradicionais de ensino. O pensamento construtivista de Piaget nos traz um conceito claro sobre a interdisciplinaridade:
“Uma colaboração entre disciplinas diversas ou entre setores heterogêneos de uma mesma ciência que conduz a interações propriamente ditas, isto é, a certa reciprocidade nas trocas, de tal modo que haja um total enriquecimento mútuo” (PIAGET, 1973, p. 142).
No Brasil, um órgão muito respeitado, a CAPES¹, também dialoga referindo um conceito sobre a interdisciplinaridade, visto que no âmbito em que opera, já realizou algumas mudanças para a definição correta das atividades e conceitos, sendo compreendida como:
“A convergência de duas ou mais áreas do conhecimento, não pertencentes à mesma classe, que contribua para o avanço das fronteiras da ciência e tecnologia, transfira métodos de uma para outra, gerando novos conhecimentos ou disciplinas, e faça surgir um novo profissional com um perfil distinto dos existentes, com formação básica sólida e integradora”. (BRASIL/CAPES, 2013 p.12).
Partindo deste conceito onde a interdisciplinaridade constrói conhecimento dos mais diversos saberes frutos da complementação de duas ou mais ciências que de forma conjunta abordem determinado tema foi criado o projeto “A AFRICANIDADE NO CONTEXTO ESCOLAR: DA LUDICIDADE ÀS RELAÇÕES PESSOAIS”. Pensado pela coordenação pedagógica como forma de atender a normativa federal da lei 10639/2003, foi proposta a interação das disciplinas na construção das práticas pedagógicas a serem desenvolvidas.
Com o objetivo de abordar, discutir e refletir sobre a questão da diversidade cultural, num processo de identificação com as identidades culturais, as diferentes disciplinas que compõem o currículo dos anos iniciais do ensino fundamental na escola municipal de ensino fundamental Genuíno Sampaio, são elas língua portuguesa, língua inglesa, literatura brasileira, ciências físicas e biológicas, educação artística, educação física, música, matemática, história, geografia, e informática, reuniram-se para organizar, as atividades conjuntas sobre a temática de ensino de história e cultura afro-brasileira e africana.
Assim estruturou-se o projeto. Em sua metodologia foram realizados três encontros para a discussão das atividades a serem propostas. Em suas ações foram realizadas cinco atividades integradas, sendo organizadas por duas ou três disciplinas de forma conjunta. O projeto teve início no dia 13 de maio de 2015. Data escolhida pela assinatura da Lei Áurea.
A abordagem da temática através das atividades integradas realizou-se da seguinte forma:        
Atividade 1 – GRIÔT
Disciplinas de Língua Portuguesa, Ciências Biológicas e Literatura.
Nesta atividade os alunos são contextualizados em relação à cultura africana. Fauna e flora africanas e a chegada dos africanos ao Brasil. A Griôt (figura da comunidade) relata aos alunos como foi a chegada dos afro-brasileiros na cidade e na comunidade.
Atividade 2 – RITOS E MITOS
Disciplinas de História, Ensino Religioso e Língua Inglesa.
Nesta atividade os alunos são contextualizados sobre o papel dos africanos na construção da cultura brasileira. Religiões de matriz africana.
Atividade 3 - MANIFESTAÇÕES CULTURAIS
Disciplinas Ed. Física, Música e Ed. Artística.
Nesta atividade os alunos são contextualizados sobre as manifestações culturais brasileiras e tiveram origem através da cultura africana. Músicas; Danças; Máscaras africanas.
Atividade 4 – RAÍZ “QUADRÁFRICA”
Disciplinas de Matemática e Informática.
Nesta atividade os alunos são contextualizados em relação aos jogos de raciocínio de origem africana, assim como algoritmos africanos.
Atividade 5 – OCAS MALOCAS E QUILOMBOS.
Disciplinas de Geografia e Ed. Artística.
Nesta atividade os alunos são contextualizados sobre os territórios negros, no estado do RS e na comunidade, e suas representações. O papel do negro nas demais culturas, ítalo, germânica, entre outras.
A última atividade diretamente ligada ao projeto foi a Semana da Diversidade. Onde em novembro, junto a semana da consciência negra, foi realizada a exposição de trabalhos realizados nas atividades integradas.
A avaliação deste projeto foi realizada de forma qualitativa observando a participação dos alunos, o interesse na realização e envolvimento nas tarefas.
E as considerações finais evidenciaram as limitações de se realizar um projeto de forma interdisciplinar dentro de um currículo mantido tradicional. Os docentes participantes destacaram o desafio de realizar atividades integradas interligando as disciplinas. Também evidenciaram o grande envolvimento por parte dos alunos e comunidade escolar.
Esta pesquisa identificou que a partir da criação da principal política pública brasileira para a educação étnico-racial, a Lei 10639/2003, os currículos escolares passaram a abordar de forma mais específica à temática do ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Através de práticas pedagógicas integradas, interdisciplinares, assim como específico em cada disciplina.

Referências
ARAÚJO, P. L.; YOSHIDA, S. M. P. F. Professor: Desafios da prática pedagógica na atualidade. Disponível em:http://www.ice.edu.br/TNX/storage/webdisco/2009/11/03/outros/608f3503025bdeb70200a86b2b89185a.pdfAcesso em 20/06/2016.
BRASIL. História e Cultura Afro-Brasileira. Lei Federal n°10.639/2003. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2003/L10.639.htm. Acesso em 14/05/2016.
______. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Conselho Nacional de Educação, 2004. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/res012004.pdf. Acesso em 14/05/2016.
FERNANDES, J. R. O. Ensino de história e diversidade cultural: desafios possibilidades. Cad. Cedes, Campinas, v. 25, n. 67, set./dez. 2005, p. 378-388.
MOREIRA, M. A.; SANTANA, J. V. J. Formação docente frente ao ensino de história e cultura afro-brasileira: reflexões a partir do município de Itambé/BA. V FIPED Fórum Internacional de Pedagogia 2013.
PIAGET, J. Para onde vai a educação? Rio de Janeiro: Livraria José Olympo Editora/Unesco, 1973.
VERRANGIA, D.; SILVA, P. B. G.Cidadania, relações étnico-raciais e educação: desafios e  potencialidades do ensino de Ciências. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 36, n.3, set./dez. 2010, p. 705-718.

4 comentários:

  1. Olá, Darlã. O que você pensa a respeito de trabalharmos nas aulas de biologia com a questão da MELANINA definindo a cor da pele dos alunos. Poderíamos apresentar fotografias de pessoas negras e de pessoas albinas. Os primeiros como tendo muita melanina na pele. Os albinos com ausência total de melanina.
    O interessante é que ambos são discriminados e sofrem preconceito racial. Uns por terem a melanina em excesso, outros por não tê-la.
    Abraço,

    RENATO BARBIERI

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  2. Na opinião de vocês a Lei Federal 10.639 é suficiente para trazer esse reconhecimento dá o fluência de outros povos na constituição do povo brasileiro??

    Gracinete Mousinho da Silva.

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  3. Vocês acham que as politicas públicas para o ensino étnico-racial nas escolas têm resolvido ou amenizado na prática os preconceitos raciais?
    Grata, Siméia Teixeira Gomes de Souza Silva.

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