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Camila Cristina

NOVAS PERSPECTIVAS DA HISTÓRIA DA ARQUITETURA NA CONTEMPORANEIDADE
Camila Cristina dos Reis de Almeida
UNIUBE

As alterações ao longo da evolução da sociedade no que diz respeito a cultura, economia e política tem direcionado a população para um universo de descobrimento e desdobramentos infinitos. Diante de tais alterações, a forma de se discutir história tem se mostrado cada vez mais ampla e diversificada, onde a monotonia e repetição de aulas projetadas e montadas em Power Point já não suprem a necessidade de se desenvolver um posicionamento crítico aos estudantes. Entende-se que, visando futuros arquitetos conscientes da produção contemporânea de arquitetura, onde temáticas como sustentabilidade e arquitetura social vem sendo cada vez mais inseridas, manter as formas tradicionais de ensino de história da arquitetura e urbanismo já não cabem as atuais escolas desta área de atuação. A experiência proporcionada pelo Programa Institucional de Monitoria de Ensino (PIME) da Universidade de Uberaba possibilita um novo entendimento e olhar acerca da disciplina de História e Teoria da Arquitetura, do Urbanismo e do Paisagismo, gerando entre alunos e professor uma discussão que aborde de forma lúdica, com auxílio de plataformas audiovisuais, e cruzada com outros campos das artes e manifestações culturais, como sociologia e filosofia, gerando conceitos advindos de uma interpretação própria da história por cada indivíduo.
O grande desafio que se nota no ensino de história voltado à arquitetura é o de desenvolver um posicionamento crítico do que se estratificou dos conceitos, hipóteses e soluções adotadas para a evolução da mesma ao longo dos anos. A necessidade de se interpretar a história e distingui-la de passado, é cada vez mais assistida no curso de arquitetura e urbanismo. Para tanto, é entendido que o ensino de história da arquitetura seja de história da arquitetura e não história geral. Nota-se, a priori, uma necessidade de se desvincular da ideia de que história é passado. Tal associação se justifica no fato de ter em foco acontecimentos datados em uma época anterior a qual estamos vivendo. Porém, a história se desdobra em uma dialética entre passado e presente na qual se mantém acerca da contemporaneidade. A compreensão de que os projetos de determinada época de produção arquitetônica e as relações entre sociedade, cultura, economia e política são justificáveis dentro daquele contexto específico é fundamental para as finalidades desejadas do estudo desse ramo dentro da graduação em arquitetura. Com base nisso, começa-se a compreender a especificidade de se ter o olhar voltado à história da arquitetura. Por mais que os acontecimentos se tornem determinantes para os rumos que a produção arquitetônica tomou, a própria produção é o que de fato vai ocasionar uma reflexão aos estudantes dessa área.  O principal posicionamento de um arquiteto urbanista está vinculado ao olhar crítico do mesmo, assim, vemos a história, ao longo do curso, como base de apoio teórico para o desenvolvimento da consciência de crítica e interpretação que culminarão na produção de arquitetura contemporânea. As dinâmicas de ensino devem, portanto, estimular tal postura e possibilitar a correlação com as disciplinas de projeto. O raciocínio critico está atrelado a tudo que se diz respeito ao pensamento de um arquiteto na contemporaneidade e, portanto, o exercício de estudar-se história e desenvolver tal postura em muito contribuirá para as novas produções arquitetônicas dos que hoje são discentes.
A utilização de recursos que atinja os mais diversos sentidos e atice a psique humana com relações indiretas com o tema de estudo pode ser vista como uma solução a ser adotada para novas disseminações de conceitos históricos. A exemplo disso, cita-se o filme “Metropolis” de Fritz Lang, 1927, e sua correlação com a vanguarda do movimento moderno conhecida como expressionismo. Partindo do pressuposto que o estudo a respeito do assunto abordado (Expressionismo) tenha sido feito anteriormente a exibição do filme, é possível se gerar um debate que venha a facilitar o entendimento do contexto histórico do movimento, das principais características observadas neste e, em alguns casos, fazer analogia com obras de arquitetura. No caso aqui citado, foi possível, com a exibição do filme e leitura da teoria a respeito da década de 1920, se extrair definições e relações entre a revolução industrial e arquitetura, o contraste da proposição de novos materiais na construção civil advindos desta época e o olhar social da arquitetura voltada para as massas.
Em se tratando de ensino, discute-se ainda a aplicabilidade da vertente filosófica da teoria do rizoma, desenvolvida pelos filósofos Deleuze e Guattari (1995) e segue, segundo os autores, seis princípios. Tais princípios abordam a conexão e heterogeneidade, a multiplicidade, a ruptura, a cartografia e a decalconomia. Um sistema de ensino baseado em tais princípios se estabeleceria multiplicidade e particularidades de cada indivíduo, proporcionando as mais diversas abordagens dentro do campo da história e teoria da arquitetura. A aplicabilidade desta teoria é ampla, podendo ser incorporada as múltiplas ciências de estudo e conhecimento. Os princípios de conexão e heterogeneidade tratam da possibilidade de conexão entre todos os pontos do rizoma, na dinâmica de ensino de história da arquitetura poderia se exemplificar tais princípios através da relação entre todas as temáticas envolvidas, porém cada qual se resulta em uma intepretação própria advinda de seus fins e de quem a estuda; princípio de multiplicidade diz respeito às diversas linhas que o rizoma pode vir a ser e as dimensões que pode atingir, assim, dentro deste campo, vemos a multiplicidade relacionada às diversas interpretações que podem ser geradas e ainda os múltiplos resultados em prática de projeto advindos de tal interpretação; princípio de ruptura assignificante aborda a questão de que o rizoma pode ser rompido e retomado, tal ponto pode ser demonstrado quando se estuda acontecimentos simultâneos na história, cada qual segue pontos pré-definidos pelo contexto, mas pode-se abandonar intepretações ou retomá-las a qualquer momento;  e os princípios de cartografia e decalconomia inserem o rizoma em um patamar de constante transformação com incontáveis reproduções, novamente diz respeito a intepretação pessoal e intrasferível de cada indivíduo, pois pode-se sobrepor conceitos, definir visão crítica e associá-los de quaisquer maneiras possíveis. O período em vigência da monitoria pôde-se experimentar funcionalidades de tal teoria quando voltada a práticas de ensino.
Qual rumo a arquitetura tomará daqui a cinquenta anos? Seriamos nós capazes de responder tal pergunta? Esta lacuna do tempo apenas o estudo da história, passados esses cinquenta anos será capaz de sanar. Portanto, cabe a nós atuais estudantes de arquitetura e urbanismo ter em mente a preocupação de interpretar de maneira eloquente o que a história hoje nos apresenta, adaptando dentro das novas tecnologias e incorporando caráter multidisciplinar a esta área, para que assim cada vez mais tenhamos disseminados por entre a sociedade, e não só entre arquitetos, os valores históricos e seus resultados mediante a produção de arquitetura na contemporaneidade.

Referências
DELEUZE, Gilles & GUATTARI, Félix. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia, Vol. 1, Tradução de Aurélio Guerra Neto e Célia Pinto Costa. Rio de Janeiro: Editora 34, 2000b.
FRAMPTON, Kenneth. História Crítica da Arquitetura Moderna. São Paulo: Martins Fontes, 1997. 
LE CORBUSIER. Por uma Arquitetura. São Paulo: Perspectiva, 1988.
BRATTO, Romullo. "José Lira: O ensino da história e o fazer da arquitetura" 11 Fev 2016. ArchDaily Brasil. Acessado 1 Mar 2017. Disponível em http://www.archdaily.com.br/br/781954/jose-lira-o-ensino-da-historia-e-o-fazer-da-arquitetura


6 comentários:

  1. PARA ARQUITETURA É DE SUMA IMPORTÂNCIA O CONHECIMENTO INTERDISCIPLINAR, O QUAL VISA ALMEJAR UM CONJUNTO DE IDEIAS EM TORNO DO OBJETO DE ESTUDO. QUAL O PAPEL A ARQUITETURA NA CONSTRUÇÃO CULTURAL DA HUMANIDADE?

    JÁYSON FELLYPE RIBEIRO PRADO

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    1. Acredito que a arquitetura só será capaz de desempenhar seu papel na construção cultural da humanidade quando a sociedade conseguir compreender o peso cultural da mesma. Primeiro passo para isso seria conhecer a arquitetura e todo seu universo de atuação. Uma vez que arquitetos urbanista paisagistas são mais que mero criadores de espaços, são interpretadores de uma realidade onde cruzar conceitos de construção civil e construção cultural é de tamanha complexidade e exige conhecimento e experimentação psico-espacial, socioeconômica etc. Exemplo disso, projeto do Museu de Arte de São Paulo, MASP, onde o vão livre é resposta de uma interpretação da arquiteta Lina Bo Bardi sobre a sociedade brasileira e suas relações com o espaço, a memória e a cultura. (O livro 'Lina por escrito' da editora CosacNaify pode dizer melhor sobre essa visão da arquiteta sobre esse e outros projetos).
      Acredito também que a resposta para essa pergunta é muito mais complexa do que parece. Conhecer arquitetura diz muito sobre a história de uma sociedade (evoluções de estilos arquitetônicos) e como esta sociedade se metamorfoseia no passar dos anos, como toda arte (literatura, escultura, pintura etc.), pois arquitetura é arte.
      Camila Cristina dos Reis de Almeida

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  2. Considerando que a maioria dos professores que lecionam história em cursos como arquitetura, design, direito etc não são historiadores, você considera a falta de formação específica na área de história como um fator dificultante ou não para a qualidade do ensino crítico e criativo da História?
    Prof. Dr. Mara Rúbia Sant'Anna

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    1. Acredito que a dificuldade em se ter um ensino crítico e criativo da História da Arquitetura diz mais sobre as didáticas de ensino adotadas pelos docentes do que suas respectivas formações. No caso específico da Universidade de Uberaba, os professores que ministram as aulas sobre história e teoria da arquitetura, do urbanismo e do paisagismo, que vão de I a IV, possuem mestrado ou doutorado em História e Teoria da Arquitetura. Por tanto, por mais que não sejam historiadores (formados por cursos de graduação em História), são historiadores de arquitetura.
      De maneira geral o ensino de história, não só da arquitetura, tem se mostrado ineficiente onde o método de 'aprendizagem' se limita a decorar datas e acontecimentos. Volto a dizer, isso se relaciona mais com a didática de ensino do que com a formação do professor.
      Camila Cristina dos Reis de Almeida

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    2. Discordo de certa maneira, e pergunto: por que alguns professores permanecem a enfatizar um modelo didático ultrapassado? Não seria por não terem formação na área e utilizarem exclusivamente suas experiências de alunos para lecionar história?
      Na maioria dos casos analisados em pesquisa recente realizada por nosso laboratório, o que se comprovou foi isto, que não historiadores tende a lecionar de maneira "automática" o conhecimento histórico, por não possuírem uma formação como pesquisadores historiadores e confundem o conhecimento que possuem na profissão que exercem e que tem relação com o curso superior onde lecionam, como o conhecimento histórico produzido pelo mesmo.
      Da mesma forma que um projeto arquitetônico não será feito com qualidade por um historiador, uma aula de história não será produzida com qualidade por um arquiteto ou por alguém que tenha estudado especificamente um aspecto histórico durante sua pós-graduação.

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    3. A comparação entre o projeto arquitetônico realizado por um historiador e a qualidade do mesmo com as aulas de história não me parece cabível a esta situação. Uma vez que historiadores atualmente se encontram em falta para aulas de ensino básico (pelo menos na minha região professores de história estão em falta nas escolas) acredito que não estariam muito dispostos a se "aventurarem" dando aulas para cursos de graduação em arquitetura ou etc. Do ponto de vista da arquitetura a relação com a história tem que se dar de forma interdisciplinar, pois a intenção do curso não é formar historiadores de arquitetura, mas fazer com que os graduandos compreendam a linearidade histórica das produções arquitetônicas em seus contextos.
      As competências do historiador não está sendo discutida aqui, apenas acredito que a imagem de um historiador de arquitetura é mais próxima de um ensino crítico de história da arquitetura.

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