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Mariane Moser; Josei Fernandes



RELATO DE EXPERIÊNCIA DO PROJETO “NOVAS PERGUNTAS EM CADA RESPOSTA: ENSINO, PESQUISA E INTERDISCIPLINARIDADE NO ENSINO MÉDIO”
Mariane Moser Bach
UNIJUÍ
Josei Fernandes Pereira
Prof.Mr. História UPF

Este relato é fruto das leituras e das vivências realizadas junto ao projeto Novas Perguntas em Cada Resposta: Ensino, Pesquisa e Interdisciplinaridade no Ensino Médio, que integra o Grupo de Pesquisa Interdisciplinar de Humanidades no Ensino Médio (GPEI), da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (UNIJUÍ). O projeto visa refletir sobre a pesquisa e a interdisciplinaridade como princípios pedagógicos para o ensino-aprendizagem de História e  Ciências Humanas no Ensino Médio, produzindo conhecimento sobre didáticas e formação de professores.
Este projeto de pesquisa é desenvolvido em duas partes, sendo uma prática e outra teórica. A parte teórica diz respeito ao estudo dos autores que fundamentam a pesquisa, tais como Pedro Demo, Edgar Morin e os documentos oficiais que regem e orientam a educação no país. Ademais, também são analisados os dados coletados através das observações da prática educativa na escola de aplicação do projeto. Essa prática consiste no acompanhamento da disciplina de História em uma turma do primeiro ano do Ensino Médio do Centro de Educação Básica Francisco de Assis (EFA), que integra o complexo educacional da fundação mantenedora da universidade a qual o projeto está vinculado. Nesta turma, os alunos desenvolvem pesquisa orientada sobre a história do trabalho, aliando-a aos estudos e conteúdos estipulados pelo currículo. Entende-se, aqui, que o conhecimento histórico ultrapassa qualquer concepção meramente informativa, constituindo-se como uma ferramenta necessária para a compreensão da complexidade social e cultural da humanidade. Assim, espera-se que esta experiência de educar pela pesquisa traga bons resultados acerca da dinâmica das aulas, da construção dos saberes, do estímulo à curiosidade investigativa e das relações interdisciplinares, ou seja, à formação integral do sujeito.
O projeto se desenvolveu da seguinte maneira: no início do ano letivo, cada aluno, entre os 23 que compõem a turma, escolheu, para pesquisar ao longo de todo o ano, uma atividade profissional que despertasse seu interesse ou curiosidade. As profissões escolhidas e a porcentagem que cada área representa entre as escolhas foram as seguintes: Ciências Exatas, Engenharias e Tecnologia (Arquitetura, Design, Engenharia Civil, Engenharia da Computação, Programação) – 35%; Ciências da Saúde (Enfermagem, Medicina, Medicina Veterinária, Nutrologia, Odontologia) - 22%; Ciências Naturais (Astronomia, Biologia, Geologia) – 13%; Gastronomia – 9%; Linguagens (Dança, Escritor) – 9%; Ciências Agrárias (Agronomia) – 4%; Ciências Sociais (Juíz de Direito) – 4% e Espionagem – 4%.
Desse modo, primeiramente, os alunos realizaram uma pesquisa sobre as atividades produtivas e as características da profissão escolhida, por meio de questões como: quem faz este trabalho, quais são as suas ferramentas (meios de produção), qual é a remuneração média etc., resultando na construção de um resumo. Em um segundo momento, após a apresentação dos primeiros resultados em forma de seminário, iniciou-se o aprofundamento sobre cada tema em perspectiva histórica. A partir disso, cada aluno construiu a estrutura do projeto que iria executar ao longo do ano, paralelamente ao estudo da evolução histórica dos modos de produção, considerando a importância da atividade produtiva escolhida ao longo da História e na atualidade, e estabelecendo os objetivos a serem alcançados com a pesquisa.
A produção do trabalho foi dividida em etapas, para facilitar a orientação e manter os alunos empenhados ao longo de todo o ano. Sendo assim, no primeiro trimestre os estudante produziram a introdução das suas pesquisas, contendo informações iniciais sobre a atividade produtiva, a justificativa, os objetivos da pesquisa e, também, os primeiros questionamentos surgidos durante as apresentações. Tudo isso, considerando os conteúdos de História aprendidos em sala de aula naquele trimestre, ou seja, o surgimento da atividade na pré-história e nas civilizações clássicas.  No segundo trimestre, a pesquisa entrou em fase de desenvolvimento, com a construção de capítulos que abrangessem os principais momentos da evolução histórica da atividade profissional escolhida. Sendo assim, os alunos refletiram sobre o papel daquele determinado tipo de trabalho numa perspectiva histórica, percebendo a evolução da maneira como foi desempenhado, a sua importância em contextos socioeconômicos diferenciados, o papel da tecnologia em sua atividade produtiva.
A última versão do trabalho foi entregue ao final do ano, dentro das normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), incluindo resumo acadêmico em dois idiomas e palavras-chave.  Por último, foi realizada a sistematização em forma de seminário de pesquisa sobre a História do trabalho, na qual cada aluno apresentou o resultado de sua produção aos demais colegas. Cabe destacar que durante toda a realização desse trabalho de pesquisa, os alunos tiveram o acompanhamento e orientação do professor de História, da bolsista de iniciação científica, que auxiliou, principalmente, na parte de produção textual, bem como, de três voluntários do Curso de História, que exerceram seus papéis de co-orientadores por meio de ambiente virtual de aprendizagem.
Depois de finalizado o trabalho, colhemos alguns depoimentos dos alunos sobre o que haviam realizado, por meio de quatro questões: a) O que você entende por pesquisa?; b) Em que medida a pesquisa sobre a história do trabalho contribuiu para o estudo da história econômica da sociedade?; c) A pesquisa sobre a profissão que você escolheu mudou e/ou ampliou sua visão sobre ela? Justifique; d) Depois da realização desse trabalho, você se sente mais preparado para realizar pesquisas futuras? Justifique. De uma forma geral, a primeira pergunta foi respondida como sendo a busca de informações para obter conhecimento sobre algo, coleta de dados, investigação de um assunto. Cabe destacar a resposta de uma aluna que diz: “Eu entendo que pesquisar é a forma de procurar a fundo o assunto de interesse, é buscar, questionar, duvidar e quando achar a resposta se perguntar o porquê daquela resposta. A pesquisa nos leva a pensar e leva a novos caminhos, entendo que pesquisa não é só buscar, mas sim compreender e interpretar o que foi encontrado.”
As respostas da pergunta “B”, por sua vez, giram em torno de que foi possível perceber como as profissões se relacionam, que cada profissão tem sua importância na construção da sociedade, bem como, que a pesquisa sobre as profissões permitiu um aprofundamento do estudo dos períodos históricos da humanidade, posto que era necessário compreender a evolução da profissão ao longo da História. A questão “C”, que faz refletir e comparar sobre a visão que se tinha sobre a atividade profissional antes e depois da pesquisa, teve respostas bem diversas: para alguns a pesquisa permitiu perceber que não é a área que querem seguir, ou seja, fez alguns alunos mudarem de ideia sobre seu futuro profissional, o que, sem dúvida, é algo de grande importância. Para outros, a pesquisa fez somente aumentar o desejo que se tinha em seguir determinada profissão. Além disso, enquanto parte dos alunos relataram que a pesquisa modificou o olhar sobre a profissão, outros disseram manter as mesmas perspectivas de antes.
A última questão relevou que todos os alunos se sentem mais preparados para realizar pesquisas futuras. Nas respostas encontramos frases como “aprofundou meu conhecimento sobre metodologia de pesquisa fazendo ser mais interessante a busca do assunto de forma geral”; “me sinto mais preparado para realizar pesquisas com segurança e qualidade”; “compreendi como organizar corretamente um trabalho”; “a cada pesquisa realizada surge alguma dúvida ou curiosidade que nos faz pesquisar e ir muito além do que nós mesmos pensávamos”; “maneiras de como fazer pesquisa, onde procurar informações, me ajudou a escrever melhor”; “tenho ideias melhores”; “o trabalho e a apresentação me fizeram criar e me desafiar a dominar o conteúdo para apresentar, vencendo a angustia e o nervosismo”.
Por tudo isso, percebemos que o trabalho de pesquisa foi significativo à maneira de cada um, seja porque ampliou ou modificou o olhar que se tinha sobre determinada profissão, alterando, até mesmo, seu desejo sobre exercê-la ou não, seja porque permitiu aprender a pesquisar. Parece que aí está o aspecto mais importante. Conteúdos podem até ser esquecidos, mas o aprender a aprender, aprender a pensar, aprender a pesquisar, referem-se a um âmbito da formação que dificilmente será desconstruído.
Foi fundamental, ao analisarmos os trabalhos entregues, considerarmos o caráter incipiente da pesquisa realizada pelos alunos, isto é, esta foi a primeira pesquisa com maior aprofundamento e com normas no padrão científico realizada por eles. O resultado foi positivo, embora constatamos, ainda, muita cópia e o fato de que alguns alunos poderiam ter se aprofundado mais. Porém, parece-nos que o mais importante aqui é considerar o processo: foi o primeiro movimento realizado em direção a uma pesquisa científica, os alunos se esforçaram para buscar e estabelecer relações entre a profissão escolhida e os temas trabalhados em aula, a maioria se esforçou para escrever com alguma autonomia e para adequar a formatação às normas. Vale ressaltar, aqui, uma passagem de Demo, a qual aponta que “o aluno que vai tentar, pela primeira vez, uma pesquisa de estilo acadêmico não tem ainda condições de fazer mais que uma interpretação reprodutiva. Caberá, sobretudo, ao orientador apontar para o caráter incipiente, inicial, insuficiente deste nível” (DEMO, 2009, p. 40). Enfim é pesquisando que se aprende a pesquisar.

Referências bibliográficas

DEMO, Pedro. Pesquisa e construção de conhecimento: metodologia científica no caminho de Habermas. 7ª ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2009.

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